Os estoques de vacinas da Covid-19 do SUS (Sistema Único de Saúde) caíram após o governo Lula (PT) perder imunizantes pelo fim da validade e reduzir entregas de doses a estados e municípios.
Todas as 17 unidades da federação que responderam à reportagem sobre a oferta de imunizantes apontaram falta total de doses ou estoques praticamente zerados.
A escassez ainda é maior para o modelo destinado ao público com menos de 12 anos. O governo do Rio Grande do Sul afirmou que não recebe esse tipo de vacina desde junho, enquanto Santa Catarina, Minas Gerais e Ceará disseram que o Ministério da Saúde enviou em julho o último lote para crianças.
A pasta comandada por Nísia Trindade disse que fará novas entregas nesta semana, mas não confirmou o cronograma nem quantas doses cada estado irá receber.
Também relataram escassez de vacinas os governos de São Paulo, Rio de Janeiro, Amazonas, Tocantins, Espírito Santo, Roraima, Pernambuco, Distrito Federal, Goiás e Maranhão.
Paraná e Mato Grosso do Sul disseram que, além da falta de estoque estadual, todos os municípios estão sem vacinas. O governo da Paraíba afirmou que recebeu imunizantes em setembro e repassou às prefeituras, mas que todas as doses tinham validade até 18 de outubro.
O desabastecimento se repete nos municípios. Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Goiânia, Salvador e Recife afirmaram que não têm doses disponíveis para nenhuma idade. Fortaleza declarou que tem vacinas somente ao público adulto.
O governo municipal de São Paulo afirmou que recebeu o último lote em setembro e “aguarda novas doses” do Ministério da Saúde, mas não confirmou quantas vacinas estão disponíveis na capital.
O site De Olho na Fila, mantido pela prefeitura, porém, indica falta de vacinas da Covid na cidade de São Paulo. Nenhum posto localizado no centro da capital tem doses disponíveis, segundo atualização desta terça-feira (22) no sistema.
A falta de doses ocorre no ano em que o governo inseriu as vacinas da Covid-19 no calendário infantil. O ministério ainda planejava entregar 70 milhões de doses atualizadas neste ano, mas até o momento repassou cerca de 8 milhões de vacinas da Moderna adaptadas à variante XBB. Dados do ministério apontam aplicação de cerca de 3,1 milhões desses imunizantes.
Parte dos governos locais disse que o ministério não confirma em que data entregará novas doses, além do volume que será repassado. O secretário municipal da Saúde do Rio, Daniel Soranz, afirmou que deve receber 50 mil unidades em 1º de novembro, enquanto o estado do Ceará declarou que a entrega de 21 mil vacinas está agendada para esta quinta-feira (24).
“É muito importante que se pare com esse tipo de vacinação ao longo do ano, de forma desestruturada, e faça uma vacinação estruturada. Igual à da gripe, que tem o período da campanha”, disse Soranz. “Também é um problema de organização do processo de compra, logística e distribuição”, afirmou ainda o secretário do Rio.
É muito importante que se pare com esse tipo de vacinação ao longo do ano, de forma desestruturada, e faça uma vacinação estruturada. Igual à da gripe, que tem o período da campanha, secretário municipal da Saúde do Rio de Janeiro.
O Ministério da Saúde ficou sem doses para repasse imediato aos estados e municípios após perder mais de 4 milhões de vacinas da única compra feita pelo governo Lula em 2024. O volume que venceu ou precisou ser trocado equivale a cerca de um terço das 12,5 milhões de vacinas adquiridas da farmacêutica Moderna.
A empresa entregou lotes com validade curta e se comprometeu a repor as doses que travaram no estoque do governo Lula. Em maio, primeiro mês de entregas da vacina da Moderna, foram repassadas 3,55 milhões de vacinas. A distribuição caiu a 2,17 milhões de imunizantes em junho, 866 mil em julho, 1,1 milhão em agosto e 550 mil em setembro.
A primeira remessa de novas vacinas, com 1,2 milhão de doses, ainda passava por análises de controle de qualidade nesta semana, entre outras etapas exigidas antes da liberação aos estados. O volume é inferior à média de 2,7 milhões de doses enviadas mensalmente aos estados de janeiro a agosto deste ano.
Em ofício de 17 de outubro, o Ministério da Saúde pediu “urgência na liberação” das doses ao laboratório da Fiocruz responsável pelo controle de qualidade.
“Devido à situação crítica de abastecimento da vacina em todas as Unidades da Federação.”
O INCQS (Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde) respondeu à Saúde, na segunda-feira (21), que as doses estavam liberadas.
As vacinas serão enviadas do estoque central da Saúde, em Guarulhos (SP), a todos os estados. Em seguida, repassadas para os municípios.
A Moderna ainda sinalizou ao ministério que deve trocar até dezembro as outras 3 milhões de doses que seguem vencidas no estoque da Saúde. A expectativa do governo é receber da farmacêutica vacinas atualizadas da variante JN.1.
O ministério também fez um pregão para registrar o preço para a compra de até 69 milhões de novas vacinas. Os itens dessa disputa foram vencidos pelo Instituto Serum, da Índia, e a farmacêutica multinacional Pfizer.
A Saúde ainda não assinou o contrato com as empresas. O ministério disse que irá encomendar doses “conforme a adesão da população à vacinação e as atualizações aprovadas pela Anvisa.”
A escolha pelo registro dos preços e a encomenda parcelada de doses se deu após o ministério perder milhões de vacinas da Covid que nem sequer deixaram o estoque federal.
A Folha revelou que o governo Lula desperdiçou ao menos 80% de um lote de 10 milhões de vacinas Coronavac compradas tardiamente em 2023. O prejuízo superou R$ 260 milhões.
O governo Lula atribui a baixa demanda às fake news. Para Eder Gatti, diretor do Departamento do PNI (Programa Nacional de Imunizações), grupos negacionistas fizeram “ataques sistemáticos” à vacinação infantil e travaram a campanha do SUS.
A falta de vacinas já havia sido apontada em setembro, quando a CNM (Confederação Nacional dos Municípios) divulgou estudo afirmando que 770 dos 2.415 prefeitos que responderam à entidade relataram desabastecimento do modelo destinado ao público infantil.
A conduta negacionista de Jair Bolsonaro (PL) na pandemia e o desdém do ex-presidente pelas vacinas foram explorados por Lula na campanha eleitoral de 2024. O atraso na compra dos imunizantes, porém, atraiu críticas ao governo petista feitas por integrantes da comunidade científica e profissionais de saúde.
Empresa que representou a Moderna no contrato com a Saúde, a Adium disse que “substituirá todas as vacinas” que estiverem “próximas ao vencimento”. “Parte das substituições já foi realizada nesta semana, com entrega ao Governo Federal.”
A empresa também disse que entregou vacinas dentro do prazo de validade. “Ciente da proximidade do vencimento, a Adium se antecipou e ofereceu a substituição ao governo federal antes de as vacinas vencerem”, afirmou a empresa.
Este projeto é uma parceria com a Umane, associação que apoia iniciativas no âmbito da saúde pública.