A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) negou nesta quinta-feira (29) que tenha tido “qualquer interesse” ao vetar a importação da vacina Sputnik V contra a Covid-19 e disse que os dados que levaram a agência a avaliar possíveis riscos à segurança com o uso do imunizante vieram do próprio desenvolvedor do produto.
A declaração ocorreu após representantes do Fundo de Investimento Direto da Rússia, responsáveis por financiar o desenvolvimento da vacina, acusarem a Anvisa de ser antiprofissional, de ter sido alvo de pressão política internacional e de divulgar, segundo eles, informações falsas sobre o imunizante.
Na segunda-feira (27), a Anvisa negou um pedido feito por dez estados para importação e distribuição excepcional da vacina. Na ocasião, diretores e equipe técnica apontaram falta de dados mínimos para aprovação e falhas em estudos e no desenvolvimento da Sputnik, os quais trazem dúvidas sobre a segurança, qualidade e eficácia da vacina.
Um dos pontos críticos apontados foi a presença, em lotes da vacina especificados em documentos, de adenovírus que pode se replicar nas células humanas, o que indica riscos à segurança.
O adenovírus é usado na tecnologia de desenvolvimento da vacina como vetor para carregar informação genética do coronavírus e induzir a resposta imune. O vírus, no entanto, não pode ser capaz de se replicar.
Mais cedo, representantes da Sputnik V disseram que vão acionar a agência na Justiça por difamação. O grupo nega a presença de adenovírus replicante no produto.
“As informações sobre a presença de adenovírus replicantes constam de documentos entregues à Anvisa pelo desenvolvedor da vacina Sputnik V”, rebateu, por meio de comunicado, o diretor-presidente da agência, Antonio Barra Torres.
“Iremos apresentar prova de que Anvisa atuou com os documentos enviados pelo próprio desenvolvedor. Não há nesta instituição nenhuma pessoa que tenha qualquer interesse ou júbilo em negar a importação de qualquer vacina.”
Em seguida, a agência apresentou trechos dos documentos e um vídeo de uma reunião, ocorrida em 23 de março, na qual representantes da vacina são questionados por técnicos da agência sobre o caso.
Em resposta, por meio de tradutor, o grupo diz, sem detalhamento, que “usou uma linha de células caracterizada, o que pode ter seus defeitos”. Diz ainda que poderia ir atrás de outras substâncias, mas que esse processo levaria tempo.
Segundo o gerente-geral de medicamentos da agência, Gustavo Mendes, os documentos mostram que o material estaria em quantidade 300 vezes acima do maior limite encontrado pela agência em regras internacionais para outros produtos.
“A empresa atesta em seu dossiê que o processo de fabricação pode produzir partículas replicantes”, disse o gerente, segundo quem a empresa apresentou justificativas que apontam a não replicação para apenas um dos dois componentes da vacina. “E o esperado pelos reguladores é a ausência de vírus replicante.”
Ainda segundo Mendes, a agência enviou um documento aos responsáveis pela vacina com pedidos de explicações sobre o caso, mas não teve resposta a esses pontos.
No comunicado, Barra disse ainda que a decisão representou um “retrato do momento”, mas que a agência está “receptiva” a novas informações que possam ser apresentadas sobre o caso.
Para ele, a Sputnik fez acusações “graves” que “impactam na confiança e credibilidade” da agência, daí a decisão por rebater as declarações. Disse ainda ter enviado os resultados da avaliação da Anvisa à Organização Mundial de Saúde e outras agências estrangeiras.
Minutos após a declaração da Anvisa, os representantes da Sputnik V disseram, por meio das redes sociais, ter enviado uma carta à agência em 26 de março em que o Instituto Gamaleya, que desenvolve a vacina, “confirma que os controles de qualidade garantem que nenhum RCA esteja presente no Sputnik V.