O procurador-geral da República, Augusto Aras, discordou da Polícia Federal e entendeu que Jair Bolsonaro (PL) não cometeu crime ao vazar informações de inquérito aberto para apurar uma invasão hacker a sistemas da Justiça Eleitoral em 2018.
Em manifestação enviada ao STF (Supremo Tribunal Federal) nesta quinta-feira (17), prazo final que havia sido estipulado pelo ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, Aras pediu o arquivamento da apuração.
Para Aras, o inquérito sobre a suposta invasão a sistemas e bancos de dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) não estava protegido por sigilo e, portanto, a sua divulgação não constituiu conduta criminosa.
Ele afirmou ainda que a PF, ao liberar uma cópia da apuração a aliado do presidente, não seguiu normas internas que estabelecem a tramitação reservada de investigações.
Aras também se manifestou sobre um pedido do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) para que Bolsonaro fosse responsabilizado por não comparecer a depoimento na polícia. O procurador-geral disse que esse pedido também deve ser arquivado.
“A conduta do mandatário configura manifestação de seu direito constitucional ao silêncio e à não auto-incriminação, a impedir a deflagração de procedimento investigativo em seu desfavor”, disse o chefe da Procuradoria.
Bolsonaro passou a ser investigado no episódio do vazamento a pedido do TSE, após o mandatário ter divulgado material da apuração ainda em curso sobre o ataque cibernético.
A respeito do vazamento, o presidente da corte eleitoral, ministro Luís Roberto Barroso, declarou que “informações sensíveis, que facilitam a atuação criminosa [contra a Justiça Eleitoral], foram divulgadas em rede mundial”.
O compartilhamento de peças do inquérito fez parte da estratégia do presidente de contestar a confiabilidade das urnas eletrônicas e encampar a tese, sem provas, de que o resultado do pleito que o elegeu foi fraudado –Suspeita rebatida pelo TSE por reiteradas vezes.
Os documentos foram usados em uma transmissão ao vivo na internet realizada por Bolsonaro em agosto do ano passado. Na época, em meio aos trabalhos da CPI da Covid, o chefe do Executivo assistia ao desgaste de sua administração, refletido nas pesquisas intenção de voto.
Encarregada da apuração, a delegada federal Denisse Ribeiro enviou a conclusão do inquérito ao STF no início deste mês. Moraes pediu à PGR (Procuradoria-Geral da República) que opinasse sobre o caso em 15 dias, providência efetivada por Aras nesta quinta.
A polícia afirmou no relatório ter visto crime na atuação de Bolsonaro, do deputado Filipe Barros (PSL-PR) e do ajudante de ordens presidencial Mauro Cid no caso.
Mesmo sem indiciamento formal, foi a primeira vez que a PF imputa crime ao presidente no âmbito das investigações que tramitam sob a relatoria de Moraes.
“As oitivas das pessoas envolvidas indicam entretanto que o inquérito obtido foi utilizado com desvio da finalidade anunciada ao presidente do feito, sendo repassado a outros funcionários públicos (presidente da república e assessor especial Mauro Cid) para ser amplamente divulgado como lastro para ilações lançadas durante a chamada live presidencial”, diz o relatório.
Na conclusão, a delegada diz que a publicização do inquérito se deu com “o nítido desvio de finalidade e com o propósito de utilizá-lo como lastro para difusão de informações sabidamente falsas, com repercussões danosas para a administração pública”.
O próprio delegado do caso divulgado por Bolsonaro disse em depoimento que a investigação conduzida por ele não identificou manipulação dos votos ou ataque à integridade das urnas.
No relatório final, a delegada também rebateu a tese levantada pela defesa de Bolsonaro de que o inquérito não estava em sigilo e, portanto, não haveria ocorrido o vazamento.
Ela argumentou que “o inquérito policial, ao contrário do processo judicial, possui como regra o sigilo, conforme doutrina majoritária, posicionamento dos tribunais (inclusive súmula 14 do STF) e diante do artigo 20 do Código de Processo Penal”.
Além desta apuração sobre o vazamento de informações, Bolsonaro é alvo de outros cinco inquéritos, incluindo o da suposta interferência no comando da PF, suspeita levantada pelo ex-ministro da Justiça Sergio Moro, um dos pré-candidato ao Palácio do Planalto.
A polícia também concluiu um outro e o isentou de responsabilidade na suspeita de prevaricação no caso da compra da vacina indiana Covaxin, o que ainda não encerra o caso.
A ministra Rosa Weber, relatora do inquérito no Supremo, mandou o caso para que a PGR (Procuradoria-Geral da República) se manifeste sobre a conclusão dos investigadores.
A hipótese mais provável é que a PGR defenda o arquivamento. Outras possibilidades seriam a realização de novas diligências ou mesmo a apresentação de denúncia ao STF. Para a corte processar criminalmente o presidente, no entanto, a Câmara dos Deputados tem que autorizar.