O argentino Juan Pablo Vojvoda, 46, chegou ao Brasil na noite do último dia 9 de maio para assumir o Fortaleza. Em pouco mais de duas semanas, já comandou o time em cinco partidas, duas delas clássicos contra o Ceará, e conquistou o título estadual diante do rival, o primeiro de sua carreira.
Não há muito tempo, porém, para saborear o campeonato, o terceiro consecutivo do clube. Neste fim de semana, os tricolores iniciam sua caminhada na Série A do Campeonato Brasileiro, contra o Atlético-MG, às 11h deste domingo (30).
“O futebol brasileiro se caracteriza por ter muitos jogos. Jogadores brasileiros são muito buscados por clubes de fora porque eles já têm muitas partidas como profissionais em pouco tempo. É uma adaptação que nós, técnicos estrangeiros, temos de fazer para trabalhar aqui”, diz o argentino, que se esforça para agregar o português ao vocabulário, em entrevista à reportagem.
Há quatro anos, Vojvoda se dedicava a terminar os estudos de Medicina, iniciados ainda na época de jogador. O ex-atleta somava as horas necessárias da disciplina Prática Final Obrigatória no Hospital Centenario, de Rosario, e faltava apenas um mês e meio para a conclusão do curso. No corredor do centro de saúde, seu telefone tocou.
Era um dirigente do Defensa y Justicia, oferecendo o cargo de treinador da equipe. A resposta não poderia esperar demais, justamente como o início de seu trabalho no Fortaleza. Vojvoda pendurou o jaleco e, já no dia seguinte, voltou a viver o ambiente que mais lhe entusiasma.
“Não me vejo como doutor. Naquele momento, gostava muito de ler, me interessava pelo assunto. Mas faz quatro ou cinco anos que não toco em um livro de Medicina. Faltava só um mês e meio para me tornar médico, mas eu decidi seguir a minha paixão”, afirma.
Formado nas categorias de base do Newell’s Old Boys, Juan Pablo Vojvoda reconhece que esteve longe de ser um jogador de destaque. Zagueiro, atuou no clube rosarino e em equipes periféricas da Espanha e da Argentina, como Cultural Leonesa (ESP) e Tiro Federal (ARG), cujos nomes lembram mais órgãos públicos do que agremiações de futebol.
Mas a experiência no Newell’s marcou profundamente o defensor. Como era jogador das inferiores, tinha acesso aos jogos no estádio Coloso del Parque, o que lhe deu a oportunidade de assistir a campanhas memoráveis do time de Marcelo Bielsa, bicampeão nacional e finalista da Libertadores no início da década de 1990.
Além do treinador, Gerardo “Tata” Martino, craque daquela equipe e que depois se tornou técnico, foi outro personagem intimamente ligado ao Newell’s que virou referência para Vojvoda.
“Não fui treinado por Bielsa, mas vivi de perto tudo aquilo. Por ter nascido no Newell’s, é logico que ele me influencia no dia a dia do trabalho, mas não quer dizer que eu trabalhe como Bielsa. Bielsa só existe um. Ele me influenciou na ordem, na responsabilidade que se deve ter, na paixão”, explica o técnico do Fortaleza.
“E Martino é uma pessoa trabalhadora, leva a mensagem ao jogador com sua capacidade, mas também com a personalidade. Te inspira uma aura de bondade.”
Desde aquela ligação recebida no corredor do hospital, o argentino comandou Defensa y Justicia, Talleres (eliminou o São Paulo da Libertadores de 2019) e Huracán, na Argentina, e o Unión La Calera, no Chile, com quem foi vice-campeão chileno na temporada passada.
Após a demissão de Enderson Moreira, a diretoria do Fortaleza buscou atender a um anseio dos torcedores por um treinador com jogo mais propositivo. O presidente Marcelo Paz conversou com Fernando Diniz, que não aceitou o cargo.
A busca continuou, até chegarem no nome de Juan Pablo Vojvoda, um estrangeiro, o tipo de movimentação que ainda é incomum em clubes do Nordeste. Não demorou para os cearenses e o técnico chegarem a um acordo.
“Tenho que ser totalmente sincero nesse sentido. O que me convenceu foi o futebol brasileiro. É uma das ligas mais importantes do mundo, um futebol que abriu suas fronteiras aos técnicos estrangeiros. Isso faz bem ao Brasil, que incorpora algumas ideias dos estrangeiros, mas ainda conserva a sua essência”, analisa o treinador.
No último fim de semana, além do Fortaleza campeão estadual, o São Paulo também conquistou o Paulista com um argentino no comando, Hernán Crespo, que chegou no início da atual temporada ao Morumbi.
Os últimos dois títulos de Libertadores foram conquistados por clubes brasileiros com técnicos gringos: os portugueses Jorge Jesus e Abel Ferreira, com Flamengo e Palmeiras, respectivamente. O último ainda levantou a taça da Copa do Brasil em menos de seis meses de trabalho.
“A liga brasileira se converteu em uma liga muito competitiva e muito atrativa para quem trabalha aqui”, diz Vojvoda, mais um argentino a desbravar o exterior, como tantos outros que já ocupam cargos por aqui e na Europa.
“Coudet no Internacional, Simeone na Espanha, Bielsa na Premier League, Crespo… Eles souberam se adaptar ao contexto em que participam. Mas cada um tem a sua própria personalidade. Crespo traz uma coisa para a sua equipe, e Coudet dá ao seu time algo totalmente diferente. Por caminhos diferentes, podem chegar ao êxito”, completa o técnico, que já o alcançou rapidamente com o título cearense, ainda que a pressa do calendário não lhe dê tempo demais para pensar nisso.
Estádio: Mineirão, em Belo Horizonte (MG)
Horário: 11h (de Brasília) deste domingo (30)
Árbitro: Caio Max Augusto Vieira (RN)
VAR: Heber Roberto Lopes (SC)
Transmissão: Premiere