A Polícia Civil fluminense apura uma denúncia de fura-fila de vacinas contra a Covid-19 no Instituto Sócrates Guanaes, organização social que atua em três estados brasileiros e no Rio de Janeiro é responsável pelo Hospital Estadual Azevedo Lima, em Niterói.
Nesta segunda (22), agentes cumpriram mandados de busca e apreensão na unidade de saúde e nas residências de um casal de diretores da instituição. Eles acharam os cartões de vacinação de seus dois filhos (enteados do homem) que demonstravam que eles tomaram a primeira dose.
Um dos jovens tem 16 anos e não terminou a escola, e a outra tem 20 anos e está no início da faculdade de medicina –ambos, portanto, estão fora dos grupos prioritários. Na lista de vacinados do hospital administrado pelo instituto, porém, eles aparecem como acadêmicos de medicina.
“Foram identificadas várias irregularidades na lista: rasuras, furos, inconsistências entre a lista da primeira e da segunda vacinação. Inclusive esses dois jovens são colocados como acadêmicos de medicina”, disse o delegado responsável, Thales Nogueira, ao programa Bom Dia Rio da TV Globo.
No hospital, a polícia apreendeu tanto as listas de vacinados quanto as listas de estagiários, estudantes, internos e residentes. A ideia é confrontá-las para entender se foi um caso isolado ou se há mais irregularidades na campanha de vacinação da unidade.
O casal, que disse aos investigadores estar separado, não teve seus nomes revelados. O homem é diretor técnico e a mulher é coordenadora de desospitalização do instituto. Eles dois e os jovens foram intimados a depor na Delegacia de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro.
As suspeitas partiram de denúncias recebidas pelo Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro (Coren/RJ). Documentos encontrados no hospital na semana passada já havia apontado incongruências, por isso a polícia pediu os mandados. Ninguém foi preso.
Em nota, o Instituto Sócrates Guanaes afirmou que foi “surpreendido pelas denúncias referentes ao Hospital Estadual Azevedo Lima relativas à iniciativa isolada dos diretores” e que ambos foram afastados para investigação interna da denúncia nos termos do seu Código de Conduta Ética e Política.
“A entidade não compactua e não admite nenhum desvio de conduta de seus colaboradores e todas as medidas serão tomadas para apuração dos fatos e punição dos envolvidos. O instituto está à disposição de todos os órgãos competentes para qualquer esclarecimento necessário”, escreveu.
A Secretaria de Estado de Saúde também respondeu que instaurou uma sindicância administrativa, que está colaborando com as investigações da Polícia Civil e que, “embora seja uma ação isolada, está reforçando entre suas equipes o irrestrito cumprimento de notas técnicas já publicadas”.
‘VACINA DE VENTO’
Também nesta segunda, uma técnica de enfermagem virou ré por supostamente ter simulado a aplicação da vacina em Niterói. O caso aconteceu num posto de drive-thru no dia 12 de fevereiro. Ela foi filmada colocando a agulha no braço de um idoso de 90 anos sem pressionar o êmbolo.
Na denúncia oferecida na última sexta (19), o Ministério Público do RJ ainda acusa Rozemary Gomes Pita, 42, de ter subtraído uma seringa e 0,5 ml do imunizante. A Promotoria argumenta que, segundo contou a coordenadora de enfermagem do local, o material e a dose não aplicada no paciente não foram encontrados.
A técnica de enfermagem foi denunciada por dois crimes. O primeiro contra a saúde pública (“infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”), que prevê detenção de um mês a um ano e multa.
E o segundo, peculato (“apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio”), que prevê reclusão de 2 a 12 anos e multa.
O Ministério Público chegou a pedir a prisão preventiva de Rozemary Pita, “levando-se em conta o risco de reiteração da prática criminosa; a periculosidade da agente; a gravidade do delito […]; o caráter hediondo do crime; a repercussão social do fato; e o elevado clamor social, público e popular”.
A juíza Daniela Barboza de Souza, porém, entendeu que não havia necessidade de detê-la: “Não se extrai dos autos os requisitos que legitimam a prisão cautelar, ao menos neste momento, a saber: risco para a ordem pública, a ordem econômica, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal”, escreveu.
À polícia Rozemary alegou que estava estressada e extremamente cansada. Ela foi afastada de suas funções pela Secretaria Municipal de Saúde e é investigada internamente também pelo Conselho Regional de Enfermagem do Rio. O idoso de 90 anos recebeu a vacina em casa depois.
Outros supostos casos de falsa vacinação isolados foram filmados e estão em investigação em cidades como Rio de Janeiro, Petrópolis, Goiânia, Maceió, Rio de Janeiro e São Paulo.