Os pedidos para que o presidente Jair Bolsonaro seja investigado pelos discursos golpistas do 7 de Setembro estão parados no STF (Supremo Tribunal Federal).
Mais de duas semanas se passaram desde as manifestações em Brasília e São Paulo sem que a corte responda aos requerimentos enviados por adversários do Palácio do Planalto.
Situação que ocorre na esteira da chamada Declaração à Nação, nota com a qual Bolsonaro afirmou, dois dias depois dos atos, não ter tido “nenhuma intenção de agredir quaisquer dos Poderes”.
Também de interesse do presidente, vem sendo adiado pelo Supremo nas últimas semanas o julgamento de um processo que discute se o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) tem direito a foro especial no caso das rachadinhas.
Os pedidos de investigação referentes às manifestações do Dia da Independência foram distribuídos à ministra Cármen Lúcia. É da liturgia processual que o Supremo colha a opinião da PGR (Procuradoria-Geral da República) sobre tais requerimentos.
Até a sexta-feira (24), segundo o sistema de acompanhamento processual do STF, a Procuradoria não havia sido acionada.
A Folha enviou um email ao gabinete da ministra e perguntou sobre o assunto, mas não houve resposta até a publicação deste texto.
Após os atos do dia 7 de Setembro, foram apresentadas ao Supremo cinco petições (tipo processual em que os pedidos tramitam) para que Bolsonaro seja investigado.
Em um deles, o vice-presidente da CPI da Covid, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), pediu a abertura de inquérito pela “grave ameaça ao livre funcionamento do Judiciário e pelo uso de recursos públicos para financiar os atos antidemocráticos”.
O congressista defendeu ainda que seja apurada a utilização indevida da máquina pública em favor dos atos, por exemplo o uso de helicópteros.
“As ameaças contra o Poder Judiciário, notadamente ao TSE [Tribunal Superior Eleitoral] e ao STF, nas pessoas dos ministros Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, são inaceitáveis e apenas confirmam, mais uma vez, que o senhor Jair Bolsonaro não pretende pacificar a relação com os demais”, disse Randolfe.
Na avenida Paulista, em São Paulo, o presidente chegou a chamar Moraes, relator de investigações que miram o chefe do Executivo e apoiadores, de canalha e pregou desobediência às decisões do magistrado.
O PDT também bateu às portas do Supremo para defender uma apuração sobre a conduta de Bolsonaro. Afirmou que ele, ao conclamar sua militância a ir às ruas em meio à pandemia da Covid-19, deve ser enquadrado criminalmente. O partido citou o trecho do Código Penal que define como delito o ato de “expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente”. Acusou também o presidente de “incitar a desordem nos seus apoiadores, especialmente a instaurar um clima bélico contra o Supremo Tribunal Federal”, passível de punição segundo a mesma lei.
A legenda pediu o envio dos autos à PGR “para fins de adoção de todas as medidas necessárias à elucidação dos crimes narrados”.
O procurador-geral da República, Augusto Aras, é a autoridade com poderes para investigar o presidente da República. Após os atos do 7 de Setembro, ele não fez qualquer comentário sobre as declarações do mandatário.
Na semana passada, ao ser empossado para seu segundo mandato no cargo, Aras afirmou que “a caneta do procurador-geral da República não será instrumento de peleja política, menos ainda de perseguição”.
Aras estava presente na sessão do plenário quando o presidente do Supremo, ministro Luiz Fux, reagiu às declarações de Bolsonaro. Na ocasião, Fux disse que a ameaça de descumprimento a decisões judiciais, se confirmada, configura “crime de responsabilidade”.
Em meio ao agravamento e ao posterior arrefecimento da tensão institucional, com articulações que incluíram o ex-presidente Michel Temer (MDB) e o ministro Gilmar Mendes, o Supremo adiou, mais uma vez, a análise da reclamação do MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) contra a decisão do Tribunal de Justiça do Rio que concedeu foro ao senador Flávio Bolsonaro.
Inicialmente, o julgamento estava marcado para 31 de agosto, mas o relator da matéria, Gilmar Mendes, decidiu adiá-lo a pedido do advogado do senador, Rodrigo Roca. O defensor afirmou que não poderia comparecer à sessão.
Presidente da Segunda Turma, colegiado encarregado de julgar o recurso, o ministro Kassio Nunes Marques indicou o dia 14 deste mês para o julgamento, que não ocorreu. E não há, segundo o tribunal, data marcada para análise.
Os atos de 7 de setembro são alvo de uma apuração do corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Luis Felipe Salomão. O magistrado avalia se houve propaganda antecipada e abuso de poder.
A investigação decorre de indícios de que a mobilização em apoio a Bolsonaro pode ter sido financiada por empresários ou políticos.
O TSE reuniu informações que incluem um vídeo no interior de um ônibus fretado por apoiadores do presidente que participaram da manifestação, além de notícias veiculadas pela imprensa.
Na gravação, segundo informou a corte eleitoral, aparece um homem trajando camiseta com dizeres de apoio ao voto impresso e que distribui dinheiro para os ocupantes do veículo.
Será apurado também se houve pagamento de transporte e diárias a quem participou dos atos e se houve conteúdo de campanha eleitoral antecipada, informou a corte eleitoral.
O material foi enviado à Polícia Federal, para que seja providenciada a transcrição do vídeo e o aprofundamento da investigação.
No STF corre um inquérito, instaurado antes do feriado da Independência e sob a relatoria de Moraes, com a finalidade de apurar a mobilização, a organização e o financiamento das manifestações do dia 7.
Bolsonaro não aparece como investigado nele. São alvos, entre outros, o presidente nacional do PTB e ex-deputado Roberto Jefferson, o cantor Sérgio Reis e o caminhoneiro Marco Antonio Pereira Gomes, conhecido como Zé Trovão, este foragido do país e contra quem há uma ordem de prisão a ser cumprida.