O Tribunal Regional Federal da 2ª Região concedeu ao prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (DEM), o direito ao foro especial no julgamento de ação penal por atos suspeitos cometidos em suas gestões anteriores.
O Ministério Público Federal ainda pode recorrer da decisão. Atualmente, a ação tramita na 3ª Vara Criminal Federal.
Na Justiça Federal, Paes é acusado de corrupção, fraude a licitação e falsificação na concorrência para construção do Complexo Esportivo de Deodoro, para a Olimpíada de 2016.
Segundo o Ministério Público Federal, o prefeito, então no MDB, atuou para que o contrato da obra fosse direcionado à empreiteira Queiroz Galvão.
Os advogados do prefeito usaram tese semelhante à apresentada pela defesa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), sobre o efeito da regra do foro em caso de “mandatos cruzados”. A expressão faz referência aos políticos que trocam de função, mas se mantêm em um cargo com a prerrogativa de foro.
A decisão do TRF-2, contudo, não se encaixa nas condições apresentadas pelo filho do presidente Jair Bolsonaro, denunciado sob as acusações de peculato, lavagem de dinheiro, apropriação indébita e organização criminosa.
O acórdão autoriza a manutenção do direito ao foro em caso de retorno a cargo idêntico ao do período dos atos suspeitos.
Em seu voto, a juíza federal Simone Schreiber, relatora do caso, afirma discordar da tese de Paes e aponta decisões em contrário de ministros tanto do STF (Supremo Tribunal Federal) como do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Contudo ela votou favorável ao pedido porque a Primeira Turma Especializada do TRF-2, que analisava o pedido do prefeito, havia concedido o benefício ao prefeito de Duque de Caxias, Washington Reis (MDB), em situação idêntica a de Paes.
“Embora tenha ficado vencida no julgamento da referida Questão de Ordem [sobre Washington], entendo que a orientação firmada pela Primeira Seção Especializada deve ser observada no caso concreto, em atenção à determinação do art. 926 do CPC de que ‘os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente'”, escreveu Schreiber em seu voto.
A magistrada indicou ainda a ausência de uma decisão do plenário do STF sobre a aplicação do foro especial em caso de mandatos descontinuados.
Uma das ações que trata do tema é a reclamação do Ministério Público do Rio de Janeiro, sob relatoria do ministro Gilmar Mendes, que questiona a concessão de foro especial a Flávio Bolsonaro pelo Tribunal de Justiça fluminense.
O voto de Schreiber foi aprovado por unanimidade. O MPF já interpôs embargos de declaração à decisão. Apontou outra decisão semelhante do TRF-2 que foi revertida pelo STJ.
A eventual mudança de foro não afeta, a princípio, as provas produzidas. O inquérito foi instruído no período em que Paes não exercia mandato. A denúncia foi proposta e aceita em março de 2020, meses antes da eleição em que o prefeito foi eleito para seu terceiro mandato.
A ação penal estava em seus passos iniciais, aguardando a resposta à acusação dos réus. Paes nega as acusações atribuídas a ele.
A defesa de Paes também tenta obter foro especial na ação penal a que responde na Justiça Eleitoral, sob acusação corrupção, falsidade ideológica eleitoral e lavagem de dinheiro na disputa de 2012. O MP-RJ afirma que Paes recebeu R$ 10,8 milhões via caixa dois da Odebrecht e beneficiou a empreiteira em contratos no município.
A ação penal atualmente está na 204ª Zona Eleitoral, sob responsabilidade do juiz Flávio Itabaiana. Os advogados de Paes usaram a decisão do TRF-2 para tentar levar o caso para o TRE-RJ (Tribunal Regional Eleitoral).
Além das ações penais, Paes também é investigado sobre depósitos no exterior supostamente feitos pela Odebrecht e pela OAS para a campanha de reeleição do prefeito em 2012.
Embora os executivos da empreiteira tenham relatado se tratar de caixa dois, a Justiça Eleitoral não identificou uso de dinheiro do exterior nas campanhas de Paes. O caso está sob investigação do MPF.
Paes nega ter recebido dinheiro de forma ilegal, seja no exterior, seja no Brasil.