O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) foi cobrado por apoiadores nas redes sociais sobre o prazo de validade dos testes para identificar o novo coronavírus e responsabilizou estados e municípios pelo eventual desperdício do material. “Todo o material foi enviado para estados e municípios. Se algum estado/munícipio não utilizou deve apresentar seus motivos”, afirmou o presidente nesta segunda-feira (22).
Como noticiado pelo jornal O Estado de S.Paulo, 6,86 milhões de testes para o diagnóstico da doença adquiridos pelo Ministério da Saúde perderão a validade entre dezembro deste ano e janeiro de 2021. Até o momento, o SUS utilizou 5 milhões de exames desse tipo. Os exames são do tipo RT-PCR, considerados como padrão-ouro para diagnóstico, e estão estocados num armazém do governo federal em Guarulhos (Grande SP) sem terem sido distribuídos para a rede pública.
A reportagem teve acesso a relatórios do Ministério da Saúde que confirmam a existência de 7,1 milhões de testes em estoque e o prazo de validade dos produtos. Além dos 6,86 milhões que vencem até janeiro, a pasta tem 212.900 testes que vencem em fevereiro e 70.800 que vencem em março. A situação levou a uma troca de acusações entre o governo e representantes dos estados. O governo Bolsonaro diz que cabe aos entes da federação fazer a demanda pelos produtos e que à União só cabe comprá-los.
Nesta segunda-feira (23), Bolsonaro foi questionado por seguidores nas redes sociais pelo risco de desperdício dos testes e isentou a União de responsabilidade. Os estados e municípios, porém, alegam que o Ministério da Saúde entregou o material incompleto e que há dificuldades para processá-los.
Carlos Lula, presidente do Conass (conselho nacional de secretários estaduais de saúde), afirma que o grupo alertou o ministério sobre a falta de insumos para que os testes pudessem ser usados -caso de swabs, tubos e reagentes, por exemplo. “É um absurdo dizerem isso [que estados e municípios não quiseram usar]. Primeiro que não sabíamos que havia esse tanto de teste aguardando. Segundo que já havíamos alertado do problema. Não adianta entregar os testes sem o material de coleta. Parte desse material só chegou em agosto, outra em setembro”, afirma.
Para ele, a compra foi superdimensionada. “Não dimensionaram a quantidade de testes que o país consegue fazer”, avalia. Até o momento, a Saúde investiu até R$ 764,5 milhões em testes, dos quais R$ 290 milhões são referentes aos testes que vencerão em breve.
OUTRO LADO
Questionado sobre o problema, o Ministério da Saúde informou, em nota, que pretende fazer estudos para avaliar a possibilidade de estender a validade dos testes, “a exemplo do que ocorreu com outros lotes de testes utilizados em outros países”. A previsão é que materiais para esses estudos cheguem ao país nessa semana, diz a pasta. Eles devem ser entregues pela empresa Seegene, que forneceu os testes, e à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), que analisará a possibilidade de uso do produto para verificação.
“Uma vez concedido esse parecer técnico, o Ministério da Saúde elaborará uma nota informativa quanto à extensão da validade e segurança da utilização dos testes”, informa.
Ainda em nota, a pasta diz que “não mediu esforços para garantir testes diagnósticos à população”, mas que os testes RT-qPCR são distribuídos “de acordo com as demandas dos estados”. “A pasta ressalta que nenhum teste de RT-qPCR perdeu sua validade e os mesmos estão prontos para serem utilizados conforme demanda dos estados e municípios, em consonância com a gestão do SUS, que é tripartite”, diz.
Secretários de saúde, no entanto, contestam e dizem que há problemas de falta de material. Dizem ainda que, embora a extensão de prazo seja possível em alguns casos, a situação precisa ser confirmada e revela uma falha de planejamento do governo. Em uma tentativa de rebater as acusações, a pasta tem dito que o uso de testes “não é a única forma de diagnóstico da doença”. O discurso, que representa um aceno ao diagnóstico pelo médico, vai na contramão do defendido por especialistas, para quem os testes são fundamentais para controle da Covid-19.
Folhapress